Pimentel, fotografado quando era prefeito em Belo Horizonte. Ele está afastado do sucessor, Marcio Lacerda, que se recusa a pagar mais por obras iniciadas em sua gestão
Ex-prefeito de Belo Horizonte e coordenador da pré-campanha da ministra Dilma Rousseff à Presidência da República, Fernando Pimentel é uma das lideranças emergentes do PT. No final de 2008, ele deixou a prefeitura após sete anos de gestão, com uma aprovação superior a 80%, e elegeu seu sucessor. No PT mineiro, Pimentel leva vantagem no embate contra o ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, pelo direito de ser o candidato do PT ao governo de Minas Gerais. Pimentel também é o principal organizador da futura campanha presidencial da amiga Dilma. Os dois militaram juntos em grupos de esquerda que combateram a ditadura militar nos anos 1960 e 1970. Se o passado mais distante explica a ascensão junto a Dilma, o mais recente conspira contra Pimentel.
Uma disputa jurídica entre um grupo de empreiteiras que realiza obras de urbanização de favelas em Belo Horizonte e a prefeitura da capital mineira provocou o afastamento político de Pimentel de seu sucessor, o prefeito Marcio Lacerda (PSB). Lacerda vem se recusando sistematicamente a assinar novos aditamentos contratuais para aumentar o valor de pagamentos por obras de construção de apartamentos para moradores de baixa renda. Segundo aliados do PSB, Lacerda afirma que os valores licitados já superam os preços praticados no mercado. Todas as obras são pagas com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), coordenado no governo por Dilma.
Lacerda e Pimentel são, em tese, aliados. Novato na política, Lacerda é do PSB, partido aliado do PT em escala nacional. Sua eleição é um caso raríssimo. Pimentel e o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, promoveram uma incomum aliança entre PT e PSDB para eleger Lacerda para a prefeitura. Antes disso, Lacerda foi secretário-executivo de Ciro Gomes no Ministério da Integração Nacional. Hoje, Ciro é o incômodo aliado do PT. Ele se recusa a aceitar o apelo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de desistir de concorrer contra a amiga de Pimentel, Dilma Rousseff, na disputa da Presidência da República. Em troca, Lula e o PT oferecem apoio a Ciro na disputa pelo governo de São Paulo – uma eleição difícil para Ciro por causa do favoritismo dos tucanos. Nas últimas semanas, o aliado adversário Ciro fez vários ataques ao PT. Disse que o partido tem “moral frouxa” e afirmou ter mais chances que Dilma de se eleger para o Palácio do Planalto por ter disputado outras eleições. O embate travado entre o PT e o PSB por causa dos preços das obras em Belo Horizonte aumenta a tensão política entre petistas e socialistas.
As obras que causaram a cizânia entre Lacerda e Pimentel são as de urbanização da Favela do Morro das Pedras, em Belo Horizonte, já visitadas por Dilma. Os empreiteiros afirmam que a atual gestão da prefeitura não conseguiu retirar todos os barracos, onde ainda vivem alguns moradores. Isso estaria aumentando os custos das empresas. “Solicitamos o reequilíbrio econômico-financeiro porque nos preparamos para fazer a obra em determinado tempo e não vamos conseguir, porque as pessoas não foram retiradas da área”, diz Roberto Gianetti de Senna, dono da HAP Engenharia, uma das empresas contratadas. “Teremos de pagar mais salários, e o preço da matéria-prima também aumentou. Mas a prefeitura continua usando a tabela antiga.” Além da HAP, outras cinco empreiteiras entraram na Justiça para conseguir aditamentos no contrato.
Senna é amigo e antigo colaborador das campanhas do ex-prefeito Fernando Pimentel. Na campanha eleitoral de 2004, a HAP Engenharia doou R$ 220 mil, a segunda maior contribuição recebida por Pimentel. Como pessoa física, Senna colaborou com outros R$ 15 mil. Na gestão de Pimentel, a HAP Engenharia ganhou o direito de prestar serviço de varrição das ruas de Belo Horizonte e de limpeza de áreas com acúmulo de lixo. Pimentel nega que exista favorecimento.“O Roberto de Senna é meu amigo e poderia ter dado mais dinheiro para minha campanha”, diz Pimentel. “O registro das doações mostra que ele agiu corretamente.” Segundo ele, o pedido das empreiteiras é normal porque elas reduzem os preços para disputar as licitações e depois têm dificuldades em executá-las. “As obras do PAC começaram aqui em Belo Horizonte. Esse pioneirismo provoca dificuldades”, afirma Pimentel.
Secretário de Políticas Urbanas de Belo Horizonte desde a gestão de Pimentel, Murilo Valadares é o encarregado de negociar com as empreiteiras. Ele afirma que o pedido das empresas é razoável, já que a prefeitura não conseguiu retirar os moradores de áreas onde estão sendo construídas novas unidades habitacionais. “São argumentos excelentes. Não se consegue retirar as pessoas facilmente porque os moradores terminam procurando o padre, o bispo, a advocacia pública e os procuradores”, diz.
O secretário Valadares e o empresário Senna aparecem em outra obra considerada suspeita da gestão de Pimentel. Uma ação civil pública impetrada em dezembro no Tribunal de Justiça de Minas Gerais pelo Ministério Público estadual pede a condenação de Fernando Pimentel por improbidade administrativa. Segundo a ação dos procuradores, em 1999 Pimentel, que ocupava então a Secretaria de Finanças da prefeitura de Belo Horizonte, repassou R$ 26 milhões à Ação Social Arquidiocesana (ASA), uma entidade da Igreja Católica, para a construção de um conjunto habitacional popular no bairro Jatobá. De acordo com o Ministério Público, parte do dinheiro teria sido desviada para pagar despesas de campanha eleitoral da reeleição de Pimentel à prefeitura em 2004. Pimentel nega. “Os procuradores cometem erros, e este é o caso”, diz Pimentel. “As casas estão lá e foram construídas para atender às exigências do mesmo Ministério Público, que obrigou a prefeitura a fazer o conjunto habitacional para retirar as famílias das áreas de risco.”
A ação dos procuradores também pede a condenação de nove dos antigos auxiliares de Pimentel, das empreiteiras Andrade Gutierrez e HAP Engenharia, responsáveis pela construção do conjunto habitacional, e a devolução do dinheiro público liberado em convênio considerado irregular. Entre os acusados estão o secretário de Políticas Urbanas, Murilo Valadares, que ocupava o mesmo cargo na época do convênio, Marco Antônio Teixeira, procurador-geral do município, José Tarcício Caixeta, presidente da empresa de urbanização de Belo Horizonte, e Roberto Gianetti de Senna, o dono da HAP Engenharia. Os padres Cássio Borges e José Januário Moreira, responsáveis pela ASA, também são denunciados como envolvidos na suposta fraude.
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