Cargas ´desovadas´: carregamentos roubados são levados para depósitos, e dali entregues aos receptadores
Risco nas estradas: na maioria dos assaltos, os motoristas são mantidos como reféns enquanto a quadrilha desaparece com os produtos. Os alimentos são os alvos preferenciais
As ações ousadas dos assaltantes ocorrem nas saídas da cidade ou mesmo em avenidas movimentadas da Capital
Eletrodomésticos, bebidas, cigarros, gêneros alimentícios, como feijão e arroz, e até lagosta já foram alvo das quadrilhas especializadas em roubos de cargas no Estado do Ceará. Em 2009, foram registrados na Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas (DRFVC), 124 assaltos a carregamentos que eram transportados nas avenidas e rodovias estaduais e federais. Somente nos dois primeiros meses deste ano, são 14 casos. Em fevereiro, entre os dias 8 e 22, foram sete registros, uma média de um roubo a cada dois dias, no Ceará. Os valores das cargas não foram divulgados.
Entre os produtos roubados no mês passado estão cargas de cerveja, açúcar, café, medicamentos, óleo de soja e refrigerantes. Apenas parte do feijão e dos medicamentos roubados foi recuperada. A carga de remédios, avaliada em R$ 600 mil foi encontrada, no dia 2 deste mês, em uma residência localizada na Rua das Margaridas, no Parque Santa Rosa. Uma mulher, identificada como Jardênia Costa Sousa, 29, foi presa por policiais militares e autuada em flagrante, na DRFVC, por crime de receptação.
Entretanto, não é comum os produtos serem recuperados. Do total de cargas roubadas pelas quadrilhas que agem no Estado, somente cerca de 26 por cento são localizados, conforme os levantamentos realizados pela Especializada. E ainda assim, geralmente, a recuperação não é integral.
Segundo o delegado Espártaco Esmeraldo, titular da DRFVC, na maioria das vezes, apenas partes dos produtos são encontradas. "Quando as quadrilhas de assaltantes agem elas já têm vários compradores específicos e, ao localizarmos o material com um comerciante, o restante já foi repassado para outros receptadores".
De acordo com o titular da DRFVC, logo após a denúncia de um roubo de carga, as investigações inicialmente têm como objetivo descobrir se o que ocorreu foi um roubo ou desvio.
Conforme Espártaco, os dois tipos de ações criminosas são aplicadas constantemente pelos grupos especializados. "As vezes começamos a apurar achando que é um roubo e, depois, descobrimos que eram um desvio", revela. Espártaco explica que quando há um ´desvio´, geralmente o motorista foi cooptado pelo bando. "Eles oferecem dinheiro e até ensinam como ele deve atuar para simular o roubo", disse.
Interior
Em alguns casos, explica o delegado, o motorista se dirige até uma cidade do Interior, ou até mesmo em outro Estado, e registra um Boletim de Ocorrência (B.O.) informando sobre o roubo da carga. Enquanto isso, seus comparsas já estão repassando o material para comerciantes em vários locais.
"Quero alertar os comerciantes que compram carga roubada. Eles estão correndo um risco muito grande, pois se forem presos em flagrante, serão autuados por receptação qualificada. No caso do motorista, ele pode ser autuado por furto com abuso de confiança ou até mesmo por apropriação indébita", assegurou o delegado. Já com relação aos roubos, Espártaco revela que as quadrilhas atacam os motoristas nas saídas de Fortaleza, em postos de combustível, em ações mais "discretas", com apenas um homem abordando a vítima e os demais integrantes da quadrilha ficam no apoio.
Em outros casos, os assaltantes agem nas BRs e CEs com a utilização de dois ou mais veículos. "Alguns são usados para interceptar o caminhão ou carreta e outro para levar o motorista e mantê-lo como refém até que a carga tenha sido entregue aos receptadores", afirmou.
Conforme o levantamento da DRFVC, dos sete assaltos registrados em fevereiro, um aconteceu na Rodovia Estruturante (CE-085), outro na Rodovia Santos Dumont (BR-116), um na Avenida Perimetral, outro na Washington Soares, um na Godofredo Maciel, e dois na Avenida Mendel Steinbruch. Em quase todos os casos a abordagem foi do mesmo modo. Veículos interceptaram os caminhões e o motorista vira refém.
PERIGO
Mercadorias sem seguro rodoviário
Se engana quem pensa que a maioria das cargas roubadas no Estado do Ceará sob a responsabilidade de empresas ´embarcadoras´ (que vendem a mercadoria e contratam entregadores para entregá-las ao comprador), estão sob a proteção de algum tipo de seguro. Apesar da grande variedade de seguros rodoviários existente no mercado, a maioria dos carregamentos, aproximadamente 80 por cento deles, estão ´descobertos´, como afirma o proprietário da empresa AM Corretagens de Seguros, Adil Mendonça Filho.
Segundo o empresário, as empresas transportadoras são obrigadas a contratarem o seguro de Responsabilidade Civil do Transportador Rodoviário de Carga (RCTRC). Contudo, em outros casos, como a das empresas embarcadoras, sem nenhum seguro, as mercadorias roubadas ´viram pó´.
Um dos seus clientes não renovou o seguro e, dias depois, teve uma carga avaliada em mais de R$ 30 mil roubada. "É um risco que muitos correm e acabam tendo prejuízo", afirma. Para Adil Mendonça Filho, falta fiscalização nas estradas. "Outro cliente teve seis cargas roubadas em oito meses, apenas duas apareceram e em uma delas, os bandidos desistiram porque o caminhão apresentou um defeito".
Mendonça Filho explica que existem dois principais tipos de seguro de transporte, o RCTRC o de Risco Rodoviário (RR), o primeiro é feito pela transportadora e o segundo, normalmente é contratado pela empresa ´embarcadora´, que vende a mercadoria e ela mesma se encarrega de entregá-la a o comprador.
O seguro RR tem outros subtipos e o mais contratado é o simples, quando o contratante paga uma taxa anual, com um valor estipulado previamente.
"Se você faz um contrato anual de R$ 50 mil e na primeira viagem tem uma carga no mesmo valor roubada, já perdeu o dinheiro investido. Agora se você faz muitos embarques, com valores menores e as cargas roubadas não superarem esse montante, você fez uma boa escolha. Entretanto, para Adil Mendonça, é necessário também uma maior fiscalização nas estradas e a intensificação das ações contra quadrilhas especializadas.
Nova delegacia
O diretor do Departamento de Polícia Especializada (DPE), delegado Jairo Façanha Pequeno, assegura que uma nova estrutura para o combate a esse tipo de crime está em fase final de implantação.
Segundo ele, uma nova delegacia, que está na etapa de conclusão, no prédio do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), além de novas viaturas e mais efetivo para a Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas (DRFVC) são algumas dessas medidas. "Nosso objetivo é reduzir os índices de roubos de cargas esse ano. Todas essas medidas que estão sendo tomadas vão contribuir para isso", ressaltou.
O diretor do DPE afirmou também que as parcerias com o Detran e a Secretaria da Fazenda (Sefaz) são muito importantes no combate a esses crimes. "As fiscalizações serão realizadas com uma maior frequência. Além disso, o delegado lembrou que o aumento do efetivo representa mais equipes investigando as ações criminosas.
F -DN :