Joseph Nye, um dos teóricos mais importantes dos Estados Unidos, diz que a mediação do Brasil no Oriente Médio é bem-vinda, mas que o país deve ser veemente ao condenar a corrida nuclear do Irã.
A mediação do Brasil no debate diplomático do Oriente Médio é útil, mas o país precisa estar atento para não encorajar o regime iraniano a buscar um arsenal nuclear. A conclusão é do americano Joseph Nye, um dos mais importantes intelectuais dos Estados Unidos e fundador, ao lado de Robert Keohane, da teoria neoliberal das relações internacionais. Em visita a São Paulo na sexta-feira (9), Nye demonstrou preocupação com a posição do governo Lula diante do presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, que foi percebida como ambígua pelos Estados Unidos. "Uma coisa é dizer que eles podem manter o enriquecimento [de urânio] e outra bem diferente é dizer que eles podem construir uma bomba”.
Nye, que serviu o governo de Bill Clinton (1993-2001) como secretário-adjunto de Defesa para Assuntos de Segurança Internacional, hoje é professor da Escola de Governo Kennedy, da Universidade Harvard. Na academia, ele desenvolveu o conceito de “soft power” (poder suave na tradução literal), que define como a capacidade que um governo tem para fazer outro governo agir de determinada forma sem ter que usar o “hard power” (poder rígido), a coerção por meio da força militar ou econômica. Em palestra na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), em São Paulo, Nye disse não acreditar que o fato de o Brasil ter apenas o “soft power” seja prejudicial para a política externa. Segundo ele, “ao desistir de buscar armas nucleares após o reaparecimento do regime democrático e ao arrumar sua economia no começo dos anos 90”, o Brasil ampliou seu “soft power” e agora pode usá-lo para conseguir avanços tanto na questão Israel-Palestina quanto com o Irã.
O ideal, segundo Nye, é que o Brasil coloque seu peso diplomático a favor da campanha para que o Irã desista de construir um arsenal nuclear. “É preciso desencorajar o Irã a buscar armas nucleares", disse. "E eu esperava que o Brasil tivesse tomado uma posição mais forte nesta questão”, disse o professor americano, transparecendo uma certa decepção com a atuação de Lula nos encontros com Ahmadinejad. De acordo com Nye, Ahmadinejad, um governante que nega o Holocausto e prega a destruição de Israel, não está aberto a ser convencido por outros presidentes, assim como o líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei. “Usar o 'soft power' neste caso é tentar convencer as gerações mais novas de iranianos de que ter armas nucleares não vai atrair seus vizinhos, ao contrário” disse. Para ele, o mundo e os Estados Unidos, em específico, devem lidar com o Irã usando o “smart power” (poder inteligente), que é a mistura do “soft power” com o “hard power”. “Claro que as negociações são importantes, mas as sanções econômicas também são, para mostrar que há uma comunidade internacional que não deseja que o Irã tenha armas nucleares”, afirmou.
Na avaliação do estudioso americano, o Brasil ajuda a comunidade internacional ao procurar atuar como mediador entre israelenses e palestinos. Para ele, "quanto mais países, como o Brasil, entrarem na questão, melhor", pois não é possível ver um fim para o conflito enquanto radicais, como o grupo terrorista palestino Hamas e os partidos da extrema direita israelense, continuarem opinando nas decisões de ambos os lados. "Será preciso uma ampla intervenção da comunidade internacional", afirma.
Tratado de Não-Proliferação Nuclear
No início da próxima semana, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, receberá líderes de diversos países em Washington para uma reunião de cúpula sobre armas nucleares. No debate, é muito provável que o Brasil seja pressionado a aderir aos protocolos adicionais do Tratado deNão-Proliferação Nuclear. O Brasil assinou o tratado, que o proíbe de obter armas nucleares, mas não os protocolos adicionais, que obrigam o país, entre outras coisas, a abrir seus centros de pesquisa para técnicos da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Para Joseph Nye, Lula deveria incluir o Brasil nos protocolos adicionais, que já foram assinados por 128 países e colocados em vigor por 98.
“O Brasil não tem um grande poder militar, mas tem a bênção de poder dominar seu continente sem isso”, disse Nye. Para ele, o Brasil não estaria em uma situação melhor em relação aos vizinhos se tivesse um poder militar maior e, particularmente, um arsenal nuclear. A prova disso, prosseguiu Nye, seria a rivalidade entre os governos militares de Brasil e Argentina nos anos 1970, quando ambos participavam de uma corrida nuclear e o Brasil assinou, com a Alemanha, um acordo para a construção de reatores. “Um alto funcionário do governo da Argentina disse para mim: ‘quando a
Alemanha colocou o Brasil na nossa frente na corrida, dobramos os esforços para chegar lá antes’”, disse. Para Nye, o Brasil é naturalmente o país dominante na América do Sul e não tem motivos para colocar isso em risco com uma corrida armamentista. "O Brasil deve saber usar sua força, pois quando seu poder crescer, os vizinhos ficarão com medo e preocupados."
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